(Para minha irmã Verahoana que fez sua passagem em 03/01/2013)
Permita-me chorar...
Pelas guerras de travesseiros na infância.
Pela fotografia no colo do Papai Noel, na Mesbla, naquele
Natal distante.
Permita-me chorar pela vez que ficamos presas no elevador do
prédio do Largo do Machado, quando corríamos atrás dos pacotinhos de doce no
dia de Cosme e Damião, e que vc fez tanta palhaçada que todo mundo se distraiu.
Pelos banhos e cabelos penteados devagarzinho.
Pelos curativos nos dodói.
Permita-me chorar por me salvar das palmadas da mamãe.
Pelo seu desespero quando meu ouvido jorrou sangue com a
pancada do rema-rema na pracinha.
Pelos truques dados nos bondes do Rio de Janeiro,
Pela viagem no trem da Leopoldina até Avelar.
Permita-me chorar pelas piadas nas noites de férias no
Sítio.
Pelos beliscões escondidos da mamãe.
Pelos primeiros presentes que podes comprar.
Pelo meu vestido de noiva.
Permita-me chorar por aceitar em batismo a minha filha e
amá-la como sua.
Pelos bolinhos de chuva com café.
Por aquele rosbife com creme de milho que eu adorava.
Permita-me chorar pelas cocadas molinhas que comprava para
mim quando chegava a São Paulo.
Pelas histórias, tipo repente, que dividíamos nas visitas a
Icaraí,
Pelos cafezinhos que tomamos juntas por aí.
Permita-me chorar pelos belos filmes que assistimos.
Pela aquela noite de tango em Buenos Aires.
Por dividir comigo seus amigos e afetos.
Permita-me chorar pelos sonhos que sonhamos juntas.
Por todas as vezes que me levou a percorrer a Europa com
seus olhos e coração.
Pelas castanhas portuguesas que vinham na sua bolsa quando
chegavas para o Natal.
Permita-me chorar pelos muitos beijos que ainda deixei de
lhe dar.
Pelos carinhos que ainda deixei de fazer.
Permita-me chorar pela pouca paciência com a vida nos últimos
tempos.
Pela tristeza que me acompanhava ultimamente.
Por ser irmã e mãe. Ouvinte, conselheira e amiga.
Permita-me chorar,
Hoje e por quanto tempo meu coração sangrar.
Alice Pinheiro Guimarães